A edição da Medida Provisória (MP) nº 984 no último dia 18
acendeu um vigoroso debate no meio futebolístico a respeito do melhor modelo de
negociação dos direitos de transmissão pelos clubes de futebol. Para além dos
impactos econômicos e, por tabela, desportivos dessa MP, é preciso considerar alguns
aspectos jurídicos.
Em resumo, a MP nº 984 alterou o art. 42 da Lei Pelé para dispor
que o direito de transmissão do espetáculo desportivo cabe unicamente ao clube que
detém o mando de campo. Ou seja, um veículo de comunicação poderá transmitir
uma partida de futebol apenas com a autorização do clube mandante. Até então era
necessária a autorização de ambos clubes de futebol envolvidos no espetáculo.
Um primeiro ponto que chama a atenção é a circunstância de
essa matéria ter sido disposta por meio de uma MP. Isso porque, esse é um
instrumento normativo com força de lei que deve ser utilizado pelo Presidente
da República apenas “em caso de relevância e urgência”, nos termos da
Constituição Federal. Por ser uma exceção momentânea à tripartição dos poderes –
segundo a qual cabe ao Poder Legislativo editar as normas –, sua utilização
deve se limitar às situações relevantes e urgentes que não possam aguardar o
usualmente longo processo legislativo. Não parece ser esse o caso da MP em
discussão, o que de início já prejudicaria sua constitucionalidade.
De qualquer modo, a MP perderá a eficácia caso não seja convertida em Lei pelo Congresso Nacional no prazo de 60 dias, prorrogável por
igual período. Nessa situação, o Congresso Nacional deverá disciplinar por
decreto legislativo as relações jurídicas dela decorrentes, quais sejam, as
consequências de eventuais transmissões e contratos ocorridos com base na MP.
Outro ponto que chama a atenção diz respeito a uma questão
já levantada pelo Grupo Globo – principal detentor dos direitos de transmissão
no futebol brasileiro – relativa ao fato de que os contratos de direito de transmissão
celebrados até então o foram com base na norma anterior, ou seja, contemplaram
tanto a situação de mandante quanto de visitante. Nesse sentido, independente
do que dispõe a MP, até o fim da vigência dos contratos já celebrados, o Grupo
Globo deteria o direito de transmissão inclusive dos espetáculos em que os
clubes contratantes com ele fossem visitantes. Ou seja, a nova dinâmica
estabelecida pela MP somente se aplicaria aos contratos celebrados após a sua
edição.
Não é possível adiantar qual a interpretação que o
judiciário dará a esse entendimento, ou, então, se o Congresso Nacional alterará
a redação da MP para deixar claro qual a solução a ser dada a essa situação
específica. É possível, no entanto, afirmar que levantará questionamentos
sob distintos ângulos.
Conforme se vê, a situação posta pela MP está longe de ser
definitiva sob a perspectiva jurídica. Melhor teria sido endereçar a questão
através de um regular Projeto-de-Lei, o qual possibilitaria uma ampla discussão
com os interessados e, certamente, uma solução mais estável. De qualquer modo, a
discussão de mérito ocasionada por ela é relevante, devendo de algum modo ser
tratada pela sociedade.
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